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Transição no Banco Central reforça cautela

Banco Central e transição que reforça cautela

Vários fatores justificam um cenário de cautela crescente na condução da política monetária. Pouco destaque, no entanto, tem sido dado à transição no comando do Banco Central.

Roberto Padovani
20 de fevereiro 2024

A comunicação do Banco Central (BC) tem sido clara. O corte de juros deverá manter o padrão atual, deixando em aberto apenas a taxa terminal e a possiblidade de mudança de ritmo em algum momento.

Visto de hoje, há bons motivos econômicos para que o BC seja crescentemente cauteloso. Pouca ênfase, no entanto, tem sido dada ao papel da transição no comando do Banco Central.

Globalmente, a história da desinflação ainda está sendo contada e há dúvidas sobre a capacidade de se superar a chamada última milha diante de novos choques, retomada do crescimento e dúvidas sobre os juros neutros.

No Brasil, o esperado não cumprimento das metas fiscais, em conjunto com um eventual aumento do risco global e a continuidade da redução do diferencial de juros a favor do Brasil, pressionam o câmbio. Não por outro motivo, os fluxos financeiros mostram saída de recursos e justificam a resistência a um movimento de apreciação da moeda.

Da mesma forma, o mercado de trabalho e os programas sociais fazem com que a renda disponível cresça acima da inflação. Desemprego baixo e gasto público elevado aumentam a probabilidade de que o crescimento esteja acima do potencial. Neste ambiente, os choques positivos de 2023 foram superados e não ajudam mais a queda da inflação.

Todos estes pontos são conhecidos e podem ser resumidos pelo debate sobre câmbio e hiato de produto. Somados, explicam a lenta convergência da inflação e o fato de as expetativas de inflação continuarem acima do centro da meta. Justamente por isso, é natural a atual prudência comunicada pelo BC.

Pouca ênfase, contudo, tem sido dada à transição no comando da autoridade monetária. Por um lado, decisões colegiadas e maior institucionalização de política reduzem o espaço para guinadas na estratégia do BC.

Por outro, no entanto, a transição no comando pode ser um argumento a favor de maior cautela, uma vez que ocorre em um contexto de críticas à meta de inflação, ao nível dos juros e à autonomia do BC. A politização da gestão monetária tornou as indicações para o BC um tema sensível.

Estudo de 2015 de Carlos Viana, Tiago Flórido e Eduardo Zilberman mostra como, na experiência internacional, os bancos centrais tendem a ser mais conservadores durantes as transições de comando.

Tanto as diretorias que saem quanto as que entram procuram dar sinais de menor tolerância com a inflação, reduzindo as incertezas sobre eventuais mudanças de preferências e, com isso, facilitando a ancoragem das expectativas.

Aplicada ao Brasil, a tese sugere que o BC deva ser mais conservador no segundo semestre, o que pode ser traduzido em um cenário de redução no ritmo de corte da Selic. Da mesma forma, considerando que os juros neutros possam estar entre 7,5% e 8,0%, as taxas terminais deveriam estar acima deste intervalo, mantendo a política levemente contracionista e permitindo a continuidade da convergência da inflação.

Esta visão parece prevalecer no mercado. Embora a pesquisa do BC mostre maior dispersão em relação à taxa terminal, que oscila entre 7,50% e 10,50%, a mediana das projeções indica uma redução no ritmo de corte a partir da reunião de setembro deste ano e encerramento do ciclo de afrouxamento no primeiro semestre de 2025, no patamar de 8,5%.

Seja como for, os argumentos a favor de uma postura conservadora parecem ter mais peso neste momento e a transição no BC apenas reforça este cenário.

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