Política de Privacidade

Recessão limita Trump

Os custos políticos e econômicos deverão impedir uma escalada da tensão geopolítica global, o que faz com que o quadro externo não seja necessariamente ruim para o Brasil

O ano tem sido intenso. Depois de passarmos pelo medo de colapso político e econômico doméstico há poucas semanas, a tensão geopolítica global se tornou nova fonte de instabilidade. O melhor termômetro deste movimento externo tem sido os juros longos nos Estados Unidos, que mostraram queda acentuada nos últimos dias.

O problema está no populismo de Trump, que tem levado a escolhas de políticas pouco consistentes e, em particular, a uma estratégia externa errática e imprevisível. Como resultado, há o temor que a política condicione a economia. Uma política externa que coloque mais peso nos compromissos eleitorais que no aumento do desemprego, por exemplo, justificaria uma escalada na disputa geopolítica com a China.

As incertezas resultantes desta escolha poderiam reforçar o fim do ciclo de forte expansão nos Estados Unidos, com um ajuste mais brusco na atividade caracterizando uma recessão técnica. A fragilidade da economia, por sua vez, levaria a uma menor pressão sobre os preços de commodities e sobre a inflação americana, compensando as altas de custos gerados pelo aumento das tarifas de importação.

Diante deste quadro, o Federal Reserve (FED) poderia então considerar a hipótese de juros de equilíbrio menores e se antecipar a um provável esfriamento do mercado de trabalho, suavizando a desaceleração. Neste caso, os atuais níveis de preços dos títulos públicos de 10 anos indicariam, mais uma vez, a probabilidade de recessão à frente, ao contrário do sugerido pelo desempenho relativamente favorável de bolsas e moedas.

A dúvida está eficácia do cálculo político, que parece de alto risco. Para que a estratégia de Trump funcione, é preciso que os novos estímulos monetários evitem que o custo social do desemprego compense o benefício político de um discurso eleitoral de proteção do trabalhador norte-americano. Qualquer erro de dosagem neste equilíbrio delicado e impreciso pode elevar as incertezas, reduzir a previsibilidade e aprofundar o desaquecimento global.

Seria um ambiente desfavorável para o Brasil. A queda nos preços de commodities e o aumento do risco do País levariam a uma reversão das posições majoritariamente otimistas dos investidores, levando a um estresse nos mercados financeiros e a um círculo vicioso entre confiança, crescimento e tensão política.

Mas talvez ainda seja cedo para apostar neste cenário. Diferentemente do período da guerra fria, há hoje elevada interdependência econômica e financeira entre as principais economias do planeta. Com a maior integração das cadeias produtivas, incertezas maiores e fluxos comerciais menores conduzem a um desaquecimento generalizado, elevando os custos sociais e políticos para todos os países.

Neste contexto, é difícil supor que o medo de uma recessão não condicione as escolhas de Trump. Na estreita relação entre economia e política, parece mais provável que, neste momento, a economia crie constrangimentos à política. De fato, a alta do risco econômico tende a produzir impactos negativos sobre a base de apoio do presidente no Congresso, o que é particularmente importante em um momento de conversas sobre impeachment e proximidade do ciclo eleitoral.

O aumento da tensão, portanto, não seria linear, ainda que as disputas geopolíticas entre Estados Unidos e China continuem pelos próximos anos. Com a volta à sensatez, as incertezas agudas do momento seriam temporárias e diminuiriam as chances de uma alta contínua no risco externo e de uma desaceleração econômica mais intensa.

De acordo com esta versão, o rendimento dos títulos públicos americanos não seria uma antecipação precisa dos próximos passos da política monetária. Em um ambiente mais estável, o FED teria tempo para aguardar novas informações sobre crescimento e inflação antes de indicar eventuais mudanças de estratégia. Com isso, menor seria a probabilidade de um novo ciclo de corte de juros e de correções de preços mais pronunciadas nas bolsas e nos mercados emergentes.

Este cenário, que está longe de ser exuberante, não é necessariamente ruim para os mercados emergentes e para o Brasil. Os riscos globais têm feito com que os principais bancos centrais mantenham as portas abertas para novos estímulos, sustentando a liquidez internacional.

Ao mesmo tempo, as restrições externas reforçam os limites das escolhas locais, permitindo que as visões mais céticas sobre a adoção de uma agenda econômica responsável e sobre as chances de aprovação de uma boa reforma da previdência continuem sendo gradualmente dissipadas. O resultado é a menor vulnerabilidade da economia a choques e o ingresso de capitais estrangeiros em um contexto internacional de poucas opções de bons retornos financeiros em mercados relevantes.

Parece, portanto, precipitado apostar na irracionalidade. Embora as escolhas de Trump assustem, as chances de um quadro otimista de estabilidade global e de avanço das reformas domésticas continuam elevadas.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Mostrar mais

Generic selectors
Apenas Busca Exata
Pesquisar por Título
Pesquisar por Conteúdo
Post Type Selectors
">
Filtrar por Categoria
Uncategorized