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Gatilho externo

Ago/17 - A piora dos fundamentos políticos e fiscais no Brasil ocorre em um momento em que os riscos globais estão se acumulando

A piora dos fundamentos políticos e fiscais no Brasil ocorre em um momento em que os riscos globais estão se acumulando

Detalhe do prédio do FED, em Washington: alta gradual nas taxas básicas cria cenário mais duro para emergentes (Foto: John Lawlor/Creative Commons)

 

Com a piora dos fundamentos fiscais e políticos, a economia brasileira vem se tornando gradualmente mais vulnerável a choques. Neste ambiente, o quadro externo ganha relevância tanto por mostrar tranquilidade no curto prazo quanto por estar acumulando riscos importantes.

Talvez o tema mais importante seja a mudança de orientação de política dos bancos centrais na Europa e nos Estados Unidos. Com a retomada econômica e avanços no mercado de trabalho, é provável que os estímulos dados a partir de 2008 continuem sendo revistos.

De fato, juros reais negativos e o aumento expressivo de liquidez na economia, através da expansão dos balanços dos bancos centrais, não parecem compatíveis com uma economia em clara recuperação. A pouca ociosidade dos fatores e o excesso de oferta monetária elevam o risco de o FED ficar atrasado no controle de pressões inflacionárias e bolhas em ativos.

Este cenário é verdade mesmo supondo uma relativa tranquilidade no risco inflacionário corrente. Como mostra o economista Richard Koo, dúvidas sobre a força da retomada, prêmios de risco achatados e ativos valorizados representam uma oportunidade para uma normalização da política monetária mais segura. A alternativa de elevar os juros e reduzir o balanço apenas em um momento em que a economia esteja aquecida e a inflação pressionada pode gerar apertos excessivos e indesejados nas condições financeiras.

Justamente por isso, a estratégia de retirada de estímulos parece definida. A inflação abaixo da meta, por exemplo, não impediu o FED de anunciar o começo do processo de redução do balanço e já ter iniciado o processo de alta gradual nas taxas básicas, construindo um seguro contra eventuais problemas.

Para os mercados emergentes, este é um cenário complicado. Apesar da saída do programa de afrouxamento quantitativo ser um processo inédito e pouco conhecido, faz sentido imaginar que a mudança de orientação na política monetária não seja neutra.

Isso porque a reversão do processo de afrouxamento quantitativo implica, a partir de agora, menor injeção de liquidez e, com isso, menor demanda por ativos. Ao mesmo tempo, a redução do balanço dos bancos centrais eleva a oferta de títulos públicos e privados, o que derruba os preços dos papéis, pressiona os juros e fortalece o dólar.

Este processo pode ser reforçado com uma eventual antecipação pelos mercados da queda de preços nos títulos e de uma reação de outros bancos centrais, temerosos de um estreitamento da demanda por títulos no momento da redução de seus balanços.

O resultado poderia ser movimentos mais rápidos e intensos no juros e no câmbio, redução dos fluxos de capitais e menor apetite por risco. Um quadro pouco favorável para os mercados emergentes, principalmente para as economias mais vulneráveis.

Para piorar, toda esta discussão acontece em um ambiente em que a China mostra desaceleração e os riscos geopolíticos se mantêm elevados. As evidências mostram que o PIB chinês influencia de modo importante a variação do preço real das commodities e, portanto, o comportamento do risco dos mercados emergentes. Ao mesmo tempo, o rápido desgaste do capital político da gestão populista de Trump pode levar a tensões internas e a conflitos globais, gatilhos para correção de preços de ativos já bastante valorizados.

O problema é que uma eventual mudança de humor é imprevisível e pode demorar, tornando complexa a construção de cenários. Nos dois casos em que houve otimismo semelhante nas últimas três décadas, a aversão a risco manteve-se baixa por um período próximo a dois anos.

O que é mais claro é o fato de o nível de incertezas globais não parecer compatível com a baixa volatilidade e a elevada confiança corrente dos investidores. Para a economia brasileira, que atravessa um momento de maior fragilidade fiscal e política, fluxos e fundamentos globais em direções opostas representam um risco importante e tornam o cenário propenso a acidentes. A calma atual dos mercados, portanto, pode mudar rapidamente, deteriorando ainda mais o ambiente econômico e político doméstico.

Koo, R. “Can QE be wound down quietly in the background?”, jun/2017, Nomura.

 

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