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A ajuda das reformas

O consenso entre economistas é de que o Brasil deve atravessar bem as turbulências globais. Mesmo com o menor impulso externo e a piora das condições financeiras locais, a expectativa é que haja apenas uma acomodação no crescimento em 2023. É possível que as reformas tenham, de fato, tornado o País mais resistente a choques externos.

O crescimento pode ser um termômetro que mostra que as reformas dos últimos anos ampliaram a resistência do País a choques externos.

Há uma boa chance que a economia brasileira atravesse relativamente bem o ciclo global adverso esperado para os próximos meses. Uma explicação para este maior fôlego pode estar nas reformas feitas nos últimos anos.

O crescimento é um bom termômetro da maior resiliência da economia brasileira, mostrando resultados seguidamente melhores que o esperado nos últimos três anos. As séries de expectativas do Banco Central para o PIB tiveram início em meados de 1999 e, neste período, a regra foi a frustração. Na pandemia, diferentemente, a surpresa tem sido positiva e a questão é saber se este comportamento se deve mais a questões conjunturais, de curto prazo, ou a temas de longo prazo.

Parte deste bom desempenho do crescimento local está associado a fatores pontuais. Os fortes e simultâneos estímulos fiscais e monetários em todo o mundo, em conjunto com o processo de normalização econômica após a pandemia, contribuem para a retomada. A indústria, afetada pela falta de insumos, mostra sinais de superação dos gargalos existentes nas cadeias globais de produção. O setor de serviços tem se beneficiado do fim dos confinamentos e a agricultura, apesar das incertezas climáticas, vive uma combinação rara de produção, preços internacionais e câmbio favoráveis.

Como as estimativas para o PIB de curto prazo são normalmente influenciadas pelas oscilações globais e domésticas na renda, no crédito e na confiança, é sempre difícil perceber e antecipar mudanças estruturais. O aumento na capacidade de crescimento é algo abstrato, inferido a partir de tendências de longo prazo ou de estimativas aproximadas de estoques de mão de obra, capital e produtividade.

Chama atenção, porém, o fato de a economia estar retomando neste o ano o patamar de produção e vendas anterior à recessão de 2014 e existir uma tendência de crescimento que novamente se aproxima da média de 2,0% dos últimos 30 anos, compatível com a mediana das projeções de mercado para os próximos anos.

Parece existir uma trajetória econômica sustentável a partir de 2016, interrompendo a perda de fôlego registrada depois de 2009. Coincidentemente, foram períodos marcados primeiro por populismo na gestão da economia e depois por reformas. Entre 2006 e 2014 o Brasil adotou políticas de estímulo à demanda com pouca ênfase na oferta. Sem reformas relevantes e com taxas decrescentes de crescimento populacional ao longo dos últimos 50 anos reduzindo a oferta de trabalho, é possível que a capacidade de crescimento tenha sido negativamente afetada.

Contribui também para desaceleração a sequência de choques gerados pela crise financeira norte-americana de 2008, a destruição de capital e trabalho da longa recessão de 2014 e o fato de as fortes restrições fiscais terem reduzido o investimento público.

A situação foi revertida a partir de 2016. Além do avanço do programa de concessões e das reformas trabalhista e previdenciária, houve a autonomia do Banco Central e avanços de marcos regulatórios importantes, como nos casos do gás e saneamento. Do ponto de vista político, a experiência desde a redemocratização tem mostrado que as transições não são acompanhadas por mudanças institucionais abruptas, o que eleva a previsibilidade e confiança.

Estimar os impactos quantitativos destas reformas sobre o PIB, normalmente dispersos no tempo, não é algo simples. Os efeitos sobre crescimento gerados por um conjunto de importantes mudanças em um período concentrado no tempo e marcado por ruídos e choques diversos complica a separação do que são movimentos temporários e permanentes.

Qualitativamente, no entanto, parece claro que estas mudanças favorecem o crescimento ao melhorar a produtividade e atrair investimentos privados que ampliam o estoque de capital[1]. A reforma trabalhista pode estar beneficiando a formalização da mão de obra e reduzindo a insegurança jurídica, o que ajuda o emprego. A mudança nas regras da previdência e a independência do Banco Central elevam a estabilidade e previsibilidade da economia, enquanto os marcos regulatórios atraem investimentos[2].

Um bom teste será avaliar a reação da economia à desaceleração global em curso. Há uma revisão ampla dos impulsos monetários globais e temas geopolíticos, sanitários e climáticos impactam diretamente produção e consumo no mundo. Com piores condições de renda, riqueza, crédito e confiança, os sinais são de desaceleração nos Estados Unidos e na Europa, com uma retomada ainda frágil na Ásia.

Neste contexto, a maior estabilidade doméstica pode incentivar desvios de comércio e investimento a favor da economia brasileira. Além dos impactos da pandemia sobre as cadeias globais de produção e sobre a logística internacional, as tensões geopolíticas na Europa, Estados Unidos e China contribuem para algum recuo na globalização e busca de relações comerciais mais seguras.

Talvez por isso, o consenso entre economistas seja de que o Brasil deverá atravessar bem as turbulências globais. Mesmo com o menor impulso externo e a piora das condições financeiras locais, a expectativa é que haja apenas uma acomodação no crescimento em 2023. É possível que as reformas tenham, de fato, tornado o País mais resistente a choques externos.

[1] A experiência do último século mostra que as reformas permitiram ao País aproveitar melhor os ciclos globais de crescimento, como observado no pós-guerra e nos anos 2000. Neste momento, existe uma clara retomada da formação bruta de capital fixo a partir de 2018.

[2] A pressão inflacionária recente, no entanto, sugere que o crescimento potencial pode estar mais próximo a 2,0% que de valores muito acima deste patamar.

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