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Ciclo global não ajuda

Apesar dos avanços recentes na economia brasileira, a mudança do ciclo global dificilmente poderá ser boa notícia.

Apesar dos avanços recentes na economia brasileira, a mudança do ciclo global dificilmente poderá ser boa notícia.

Uma leitura presente nos mercados financeiros é a de que a piora nas condições econômicas e financeiras globais pode ajudar a economia brasileira. A ideia é que os bons fundamentos do País, quando comparados a outros mercados, aumenta a atratividade dos ativos locais.

A situação global não é boa. O fato de a inflação estar em seus níveis mais elevados em quatro décadas tornou-se um problema importante para mercados. Com uma tendência histórica de queda da inflação, não há referências sobre quão intensa deverá ser a reação do Federal Reserve neste momento. Não há um padrão recente confiável sobre qual a resposta da taxa de juros a desvios tão importantes de inflação e produto.

Na mesma linha, os experimentos monetários de expansão monetária de 2008 passarão por um novo teste. Diferentemente da crise bancária, neste momento o endividamento é baixo e a demanda está aquecida, exigindo uma retirada mais rápida dos estímulos. Com pouco histórico, a condução de política monetária nas circunstancias atuais dificulta estimar os impactos sobre a atividade econômica.

Não bastassem os temas econômicos, a economia mundial enfrenta várias frentes de instabilidades geopolíticas, sanitárias e climáticas, que trazem impactos sobre contas públicas, logística, cadeias globais de produção e oferta de matérias primas. Diante deste quadro, antecipar cenários de inflação, juros e crescimento se tornou algo mais complicado.

Neste contexto global complexo, o Brasil mostra uma situação mais favorável. Os dados de curto prazo de balanço de pagamentos, contas públicas, inflação e crescimento têm mostrado uma tendência positiva. Ao mesmo tempo, o País fez importantes reformas ao longo dos últimos anos, como a trabalhista, a previdenciária, a autonomia do Banco Central e a revisão de marcos regulatórios importantes, como do gás e saneamento.

Embora os impactos destas alterações sejam de difícil estimação, faz sentido supor que são fatores que ampliem a capacidade de o País crescer a médio prazo e aumentem a resiliência da economia a choques externos. Não se pode descartar, por exemplo, que o cenário geopolítico global favoreça algum desvio de comércio e investimentos para o Brasil.

O quadro político reforça esta leitura mais otimista. As últimas eleições e transições sugerem que a corrida presidencial não representa riscos institucionais relevantes ou revisões amplas de reformas e gestão de política econômica.

O problema, no entanto, é que o padrão histórico mostra que os mercados emergentes acompanham os ciclos econômicos e financeiros globais, com maior ou menor intensidade. No caso brasileiro, a correlação e causalidade entre os indicadores mensais de PIB no Brasil e nos Estados Unidos (IBC-Br e ISM) mostram que a economia local segue os movimentos externos. Da mesma forma, bolsa, câmbio e juros no Brasil são altamente correlacionados com as oscilações externas.

Fatores locais devem também dificultar o descolamento dos mercados locais das incertezas externas. Ciclicamente, o menor impulso externo e o aperto monetário devem contratar uma mudança de ritmo do crescimento, mesmo que os impactos favoráveis da reabertura da economia sobre o setor de serviços e os estímulos fiscais contribuam para suavizar este movimento.

Em um quadro de menor crescimento e pressão por gastos públicos, é possível que o próximo governo volte a enfrentar uma dinâmica de dívida menos favorável. Uma possível eleição competitiva em um quando de desaquecimento cíclico da economia tende a gerar governos pouco populares. Um ambiente politicamente frágil não favorece a continuidade do ciclo reformista e dificulta a antecipação das escolhas de políticas econômicas, implicando maiores incertezas em relação à trajetória da dívida pública.

O comportamento dos ativos financeiros neste ano tem sido um bom termômetro. Os mercados locais acompanham o humor dos investidores internacionais em um momento de elevada complexidade em se produzir diagnósticos e cenários. Com os diversos choques produzidos pela pandemia, tem sido complicado antecipar os movimentos dos bancos centrais e as respostas em termos de crescimento global. A perda de referências, por sua vez, traz volatilidade e mudanças frequentes nos fluxos de capitais.

O resultado é que, em um contexto marcado por quebras de padrões, o descolamento da economia e dos mercados brasileiros a um quadro global mais negativo seria mais uma novidade surpreendente.

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