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Banco Central: de olho em 2020

A nova frustração com o crescimento, os números mais baixos de inflação e os sinais do Banco Central têm estimulado um debate sobre a viabilidade de um novo ciclo de corte da taxa de juros no País. E tudo indica que o comportamento das expectativas de inflação para o próximo ano será decisivo para esta decisão.

Há muitos fatores que favorecem um corte. Como a economia opera muito abaixo de sua capacidade e o desemprego interrompeu sua trajetória de melhoria gradual, os núcleos do IPCA oscilam em níveis historicamente baixos, assim como as expectativas de inflação estão significativamente abaixo da meta para este ano.

Neste contexto, uma eventual aprovação da reforma da previdência tende a atrair fluxos de capitais e apreciar a moeda, reduzindo ainda mais a pressão de custos das empresas e permitindo a redução do risco inflacionário.

Da mesma forma, os avanços institucionais dos últimos dois anos poderiam justificar taxas de longo prazo menores, as chamadas taxas neutras. Evidências neste sentido seriam o crescimento econômico aquém do esperado e/ou a não aceleração inflacionária, sugerindo que os estímulos monetários correntes poderiam estar sendo menores que o imaginado. Este ambiente pode ser bem descrito pela regra de Taylor: os desvios da inflação em relação à meta e do PIB em relação ao seu potencial sugerem espaço para cortes adicionais da taxa de juros.

A comunicação do Banco Central reforçou esta leitura. Os sinais são de que, aprovada a reforma da previdência, haveria espaço para juros mais baixos. Mas para que este cenário se concretize é fundamental que as expectativas de inflação para 2020 continuem em queda e fiquem claramente abaixo da meta.

Isso porque novos cortes ao longo do segundo semestre de 2019 devem gerar seus efeitos plenos apenas em 2020, reforçando a recuperação cíclica já em curso na economia. De fato, aprovada a reforma da previdência, é possível que haja apreciação cambial, aumento da confiança e busca por risco. Além da alta esperada no mercado de ações, a queda dos spreads nas operações de crédito bancário e nas emissões no mercado de capitais permite que as condições financeiras continuem melhorando, dando, com isso, novo impulso ao crescimento e acelerando a convergência da economia em direção ao seu potencial.

Como as expectativas para 2020 já estão próximas à meta, um menor hiato do produto eleva o risco inflacionário e coloca pressão no processo de normalização da política monetária. Embora nada impeça que cortes de juros neste momento sejam seguidos por altas em um futuro próximo, os bancos centrais costumam suavizar seus movimentos para aumentar a previsibilidade dos cenários e reduzir as incertezas.

Neste caso, para que haja espaço para cortes neste ano, é preciso que as expectativas de inflação mostrem recuos importantes, o que não parece provável acontecer neste primeiro semestre. Além das incertezas em relação ao ambiente político, os choques correntes em combustíveis e alimentos podem reforçar a estabilidade das expectativas. Não menos importante, as metas de inflação mais baixas para os próximos anos fazem com que os atuais desvios do IPCA sejam pouco relevantes.

Estes riscos podem ser altos demais para o banco central brasileiro. A gestão de política no Brasil é, historicamente, mais sensível aos desvios de inflação que de atividade, o que faz sentido diante de seu mandato e do histórico de descontrole inflacionário. Em particular, é natural que haja nos inícios de gestão uma maior preocupação em construir reputação[1].

Esta sensibilidade pode ter sido reforçada recentemente. A experiência populista aceitou taxas elevadas de inflação, com o IPCA ficando significativamente acima da meta durante sete anos (2010-2016). Diante disso, três anos com inflação abaixo da meta (2017-2019) ajuda a resgatar a confiança na gestão econômica do País[2]. Além disso, apesar de a inflação corrente ser baixa para padrões históricos locais, a comparação internacional não é favorável. Mesmo com uma forte recessão, o índice de preços ao consumidor no Brasil apenas convergiu para a média de países como Chile, Peru, Paraguai, Bolívia e Colômbia.

Tudo considerado, novos cortes só poderão acontecer diante de quedas adicionais do risco inflacionário para 2020, o que seria possível com uma combinação de economia frágil e apreciação cambial. Apenas a inflação corrente ou a frustração com o ritmo de crescimento dificilmente irão permitir um novo ciclo de afrouxamento monetário.

[1] Viana, C., Florido, T., Zilberman, E. “Transitions in Central Bank Leadership”, Jul/2017.

[2] Há certa semelhança desta ideia com o atual debate sobre o sistema de metas de inflação nos Estados Unidos. A tese é que desvios correntes na inflação possam ser compensados por desvios em sentido oposto no futuro. Ver Bernanke, B.S. “Evaluating lower-for-longer policies: temporary price-level targeting”, Brookings Institute, Feb/2019.


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