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O alerta dos juros

Nov/17 - Enquanto bolsa e câmbio incorporam cenários positivos, os mercados de juros mostram maior cautela ao avaliar os riscos à frente

Enquanto bolsa e câmbio incorporam cenários positivos, os mercados de juros mostram maior cautela ao avaliar os riscos à frente

Animados pela liquidez internacional, investidores têm preferido apostar na bolsa e no câmbio. Já em relação aos juros, são mais cuidadosos, observando as condições de solvência da dívida interna e o avanço de reformas (Foto: Armstrong-Flickr/Creative Commons)

 

Um tema de mercado que tem chamado atenção há algumas semanas é a inclinação da curva de juros. Ao contrário da euforia recente observada na bolsa e no câmbio, os juros parecem incorporar cenários menos otimista, com a inclinação da curva em seu patamar mais elevado em 8 anos.

Como as variações na bolsa e no câmbio tendem a acompanhar os movimentos nos juros, a divergência observada neste momento pode não ser usual, o que seria um sinal dos também distintos riscos de solvência da dívida interna e externa.

Isso porque bolsa e câmbio são ativos influenciados pela disposição dos investidores internacionais em correr riscos, disposição impactada pelas condições globais de crescimento e liquidez. É exatamente o que temos visto ao longo dos últimos meses. Desde meados do ano, prevalece a leitura que a inflação baixa nos Estados Unidos irá conduzir a uma normalização muito gradual da política monetária, o que implica a manutenção da liquidez global.

Além disso, o Brasil mostra um bom desempenho em seu balanço de pagamentos, o que assegura níveis adequados de reservas internacionais e reduz o risco dos investimentos em moeda estrangeira. Justamente por isso, a atratividade dos mercados locais de câmbio e bolsa tendem a acompanhar o risco de não pagamento dos compromissos externos, justificando a elevada correlação destes mercados com o comportamento do CDS.

De fato, toda turbulência política doméstica e as dificuldades fiscais correntes não impediram relativa estabilidade do câmbio no último ano ao redor de R$ 3,20 e uma alta superior a 20% do Ibovespa nos últimos seis meses. Ainda que a queda de juros locais explique de modo importante o desempenho recente do mercado de ações, ajuda o fato de o CDS rodar próximo aos níveis praticados quando o Brasil era grau de investimento.

Este otimismo não se apresenta no caso dos juros. Como este mercado é mais sensível à percepção dos riscos inflacionários e ao comportamento dos juros estruturais locais, os investidores estão mais atentos às condições de solvência da dívida interna e ao avanço de reformas que às condições de liquidez global e ao balanço de pagamentos.

Neste caso, é natural que o risco seja maior neste momento. Os desafios fiscais e políticos ainda não permitem segurança em relação à dinâmica da dívida interna, mesmo com todos avanços institucionais recentes. Mais que ajustes de curto prazo nas contas públicas, é necessária uma reforma fiscal para se alcançar resultados primários compatíveis com a estabilidade de dívida. Da mesma forma, o processo eleitoral segue indefinido e marcado por discursos populistas de direita e esquerda, elevando as incertezas em relação à capacidade de se reformar o Estado.

Não por outro motivo, os mesmos estrangeiros que se animam com o mercado acionário local têm gradualmente reduzido sua participação no financiamento da dívida pública e nos mercados futuros de juros, sugerindo menor conforto em relação às condições de solvência da dívida interna. Os juros parecem mais ajustados aos alertas das agências de risco que aos prêmios de risco soberano praticados continuamente nos mercados internacionais.

Como bolsa, juros e câmbio respondem neste momento a dinâmicas diferentes, não há como dizer quem está certo ou errado. Mas parece fazer sentido que os riscos possam estar sendo melhor precificados nos juros.

No caso dos juros, embora a elevada ociosidade dos fatores e os avanços institucionais reduzam a pressão sobre inflação e a política monetária, favorecendo um cenário de estabilidade de dívida, os prêmios de risco dos mercados mostram que os investidores atribuem probabilidades elevadas a cenários adversos, como o de vitória de um discurso populista na eleição presidencial de 2018.

Isso não parece verdade no câmbio e na bolsa. Há, pelo menos, dois riscos subestimados. O primeiro é o próprio excesso de liquidez. A euforia normalmente incentiva a tolerância com riscos, induzindo o descolamento dos preços de ativos de seus fundamentos e a formação de bolhas. Abre-se espaço para correções súbitas e pouco racionais. O segundo é a fragilidade de um cenário baseado no ceticismo em relação às estratégias de redução da liquidez já anunciadas pelos bancos centrais na Europa e no Estados Unidos. Basta que o comportamento da inflação mude, como já ocorreu em 2016, para que o sentimento do investidor também se altere.

Combinados, estes riscos são um problema. A alta de juros internacionais pode ser o gatilho para correções em preços dos ativos financeiros, elevando a aversão a risco em um ambiente de volatilidade geopolítica e pouco dinamismo de preços de commodities. Um exercício simples mostra que a volta da aversão a risco para seus patamares históricos médios, tudo o mais constante, poderia levar o CDS a operar na faixa de 250 bps, mais compatível com os alertas das agências de classificação de risco para os riscos fiscais locais. Neste caso, o dólar poderia superar o nível de R$ 3,40 e o Ibovespa oscilar abaixo de 70 mil pontos.

Neste caso, a inclinação da curva de juros não deixa de ser um alerta para atual complacência nos mercados domésticos de bolsa e câmbio.

 

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